Há 25 anos à frente da União de Leiria, João Bartolomeu tenta fazer frente a um dos momentos mais difíceis da sua liderança. Na entrevista, parcialmente feita por escrito, o empresário de 66 anos explica as razões das dificuldades financeiras que atravessa a SAD, admite incumprimento “com muita gente”, mas acredita que o futuro será melhor. Nega estar agarrado à cadeira e salienta não querer fazer dinheiro com o futebol. Por isso, os interessados em adquirir asua participação só terão de o fazer pelo valor da dívida que a empresa lhe deve. O Grupo Lena está na mira das suas maiores críticas |
Têm sido tornadas públicas, dívidas, acções judiciais e incumprimentos fiscais relacionadas com a SAD da União de Leiria. O que se passa? A questão que me coloca, apesar de pertinente, não deixa de encerrar, por si só, uma outra questão, que é o facto de no actual cenário de crise em que submergiu toda a Europa, ser absolutamente normal que em todos os sectores da actividade, as empresas - e a União de Leiria SAD é uma sociedade comercial - enfrentem dificuldades acrescidas que levam ao aumento das situações de contencioso e também de dificuldades de cumprimento perante alguns credores, entre os quais, naturalmente, a administração fiscal. A SAD corre o risco de se tornar insolvente? É uma máquina trituradora de dinheiro. Tudo custa muitos euros, mas quem quiser fazer auditorias à SAD está à vontade. Nunca recebi um euro por uma transferência, nem almoços, nem jantares. Estamos neste momento em incumprimento com muita gente, mas se Deus quiser, com esta alteração que queremos fazer, vamos cumprir com todos. Vamos ser visitados em breve por uma pessoa que, acreditamos, vai injectar dinheiro na SAD. Seria uma pena que Leiria ficasse sem futebol. Quem? Não quero falar nisso, mas vai haver grandes mudanças na União de Leiria. Mas há ordenados em atraso... A União de Leiria viveu sempre à base dos dirigentes, só que infelizmente as empresas estão mal e o futebol acaba por sofrer as consequências. Acho piada, há clubes em pior situação, mas só falam da União de Leiria. É uma estratégia organizada para eliminar a União de Leiria e descer de divisão. Porquê? Porque não temos medo. Como não temos rabos de palha e eles têm, como não ganhamos dinheiro com o futebol e eles ganham, foram desmascarados e apanhados. Falo alto porque estou descansado. Admite voltar para Leiria? Não. Em primeiro lugar temos um contrato de três anos com a Câmara da Marinha Grande que queremos cumprir. Depois, desde que António Martinho permaneça na Câmara de Leiria como vereador, a União de Leiria não voltará. O JORNAL DE LEIRIA sabe que foi sondado para vender a sua participação na SAD. Quem são os interessados? A única vez que fui sondado, estivemos a mostrar a contabilidade da SAD, penso que foram mandados pelos senhor presidente da câmara. Não sei se foi ele, mas o que sei é que houve umas reuniões na câmara com um investidor brasileiro. Comprava tudo, até queria comprar o Cinema City, mas quando chegou a hora de meter os advogados ao barulho, desapareceu do mapa. Era um vigarista, um burlão. Era só conversa. Por quanto é que venderia a sua participação na SAD? Não quero ganhar dinheiro com o futebol. O único valor que quero receber é o das dívidas. Confirma os 4 milhões de euros... É um valor que ronda essa verba. Há quem diga que está agarrado à cadeira... Quero é fugir daquilo! Ao contrário do que as pessoas pensam, já me custa ir ao futebol. Tenho 66 anos e queria passar o resto da vida descansado. Mas como sei que aquilo vai cair quando sair de lá, queria ver se aparecia alguém para aguentar aquilo. Como é o seu relacionamento com os accionistas Media Capital e Grupo Lena? Posso adiantar que com a Media Capital a relação é perfeitamente normal. Relativamente ao Grupo Lena, muito há a dizer, mas mais haverá para investigar, para que os leirienses percebam, de uma vez por todas, a razão pela qual apareceram como accionistas da SAD. O que quer dizer com isso? Seria bom que os órgãos próprios esclarecessem a exorbitante derrapagem no custo das obras levadas a cabo no Estádio Municipal, quais os interesses conexos com tal agravamento nos custos que relembro, ascendeu a cerca de 80 milhões de euros. Quem lucrou com esta situação? Outro exemplo: a construtora Soares da Costa, que havia impugnado o concurso para as obras do estádio e ao que parece, terá visto a impugnação deferida no Tribunal da Relação de Coimbra, viu ser-lhe adjudicada a empreitada para a construção da ponte que permite o acesso ao Estádio, uma empreitada de vários milhares de euros. Esta situação é tudo menos clara. Mas há mais situações para as quais os leirienses têm de ser alertados para que possam questionar o porquê das coisas. Temos em nossa posse um cheque de 400 mil euros emitido pelo Grupo Lena a favor do SC Portimonense. Note bem. Não é da União de Leiria. Que tipo de negócios estão subjacentes à emissão deste cheque? Que saibamos inexistiu qualquer contrato de publicidade entre ambos. Se foi para fazer caridade, o Grupo Lena deveria ser solidário com outro tipo de instituições, que precisam seguramente muito mais que aquele clube. Seria natural que sendo accionista da União de Leiria, o Grupo Lena pudesse contribuir para o fortalecimento e robustez da sua participada, dando-lhe uma injecção de pujança para que esta pudesse cumprir com as suas obrigações de forma mais desafogada e investindo no seu negócio. Nada disso aconteceu. Recentemente, a União de Leiria foi accionada judicialmente pela Construtora do Lena relativamente à transferência do jogador Maciel para o FC Porto, situação que se verificou há cerca de 10 anos e que eles bem sabem não fazer qualquer sentido. A União de Leiria não pactua com este tipo de procedimentos, razão pela qual apresentámos já uma denuncia junto dos serviços competentes para investigar tudo aquilo que por aí se comenta em surdina. A União de Leiria jogar fora da cidade de Leiria é, no mínimo, estranho. O que de tão grave aconteceu que o levou a tomar esta decisão? É necessário ter em conta o seguinte: Primeiro, a União de Leiria sempre jogou em Leiria, no anterior Estádio e mais recentemente no novo estádio Municipal. Segundo, a União de Leiria não tinha quaisquer custos no anterior Estádio, mas atendendo às obras de remodelação e por entendermos e concordarmos com o conceito de utilizador-pagador, aceitámos pagar. Terceiro, os contratos que celebrámos com a sociedade gestora decorreram normalmente, numa primeira fase, não só porque o valor que nos era inicialmente cobrado estava dentro das nossas parcas possibilidades, mas também porque havia respeito mútuo no cumprimento dos deveres ali consagrados. Quarto, já no decurso da época desportiva 2010/2011, a relação começou a deteriorar-se em face da ausência de comunicação, pela Leirisport, das receitas que a mesma obtinha com a publicidade e com a assistência aos jogos. Em paralelo, cobrava-nos sistematicamente um valor que considerámos exorbitante, tanto mais que a ausência de comunicação de receitas não nos permitia fazer o devido acerto de contas entre o deve e o haver. Paralelamente, a questão da venda dos camarotes que nos permitiria realizar mais algum capital, por forma a compensar o valor dos 17.500 euros + IVA que pagámos por cada jogo ali realizado, eclipsou-se fruto da falta de diligência daquela entidade e, portanto, considerámos naquela altura que não estavam mais reunidas as condições para que se mantivesse a relação contratual. Nesta conformidade, em Fevereiro de 2011 comunicámos à Leirisport a rescisão unilateral e com justa causa de tal contrato, tendo pedido judicialmente uma indemnização de 500 mil euros. De referir ainda que requeremos recentemente a insolvência da empresa municipal face ao completo desenquadramento legal de que a mesma padece e ao exorbitante défice que apresenta e cujo pagamento sai dos bolsos de todos os munícipes. Já assumiu ao JORNAL DE LEIRIA que transferiu activos da SAD para empresas dos accionistas, algumas das quais geridas por si. Não considera que desta forma esvaziou a SAD de valor? Não assumi, nem podia assumir, ter transferido os activos da SAD. Convém clarificar que a União Desportiva de Leiria Futebol SAD não transferiu os seus activos para as aludidas sociedades, antes deu os mesmos como garantia nas diversas operações financeiras destinadas a permitir o seu normal funcionamento quotidiano. Por conseguinte, a SAD mantém os seus activos. Esta situação apenas ocorre porque as entidades desportivas necessitam de garantir a disponibilidade da sua tesouraria para fazer face aos compromissos que assumem. Para isso necessitam de recorrer a empréstimos ou financiamento de terceiros, os quais, naturalmente, pressupõem a cedência de algumas garantias por parte dos benefícios, o que, no caso em apreço, foi elaborado com as formalidade legais essenciais e com total transparência. Esta é uma situação recorrente nos clubes de futebol e sociedades desportivas, assim como no quotidiano empresarial. Só é notícia porque envolve o nome da União de Leiria e porque parte de afirmações caluniosas proferidas por alguém que se afirma empresário de jogadores mas que efectivamente não está licenciado para o exercício de tal actividade, no caso Murilo Maia, no âmbito de um processo judicial que decorre, o qual nem sequer tem ainda designada a competente audiência de discussão e julgamento, nem logicamente qualquer sentença. “José Mourinho nunca escolheu um jogador para a União de Leiria” Quem foram os melhores jogadores que passaram na União de Leiria? Quem decidiu os atletas fui sempre eu. O José Mourinho, por exemplo, nunca escolheu um jogador para a União de Leiria. Estão todos enganados quanto a isso. Depois lançou-se e é fácil em clubes com muito dinheiro escolher os melhores jogadores. Em Leiria é diferente. É um clube ligado à máquina, o que torna as coisas mais difíceis. O Derlei era um grande jogador, o Nuno Valente, o Helton, até o Carlão. Passaram por Leiria fantásticos jogadores. E fizeram-se em Leiria grandes treinadores, custe o que custar aos meus críticos, que são sempre os mesmos à mesa do café, porque frontalmente não me enfrentam. Custa-lhes muito ter apostado em José Mourinho, ter relançado o Jorge Jesus que estava parado há dois anos, ter optado pelo Domingos, que o primeiro clube que treinou foi a União. Esses três treinadores e o Paulo Duarte foram os melhores que passaram por Leiria. Tem olho para os treinadores... Olhe, hoje (ontem), já temos novo treinador. É o José Dominguez, que vai ter como adjunto o Oceano. E o que viu no Dominguez? É o trabalho que tem feito nos juniores? Foi o que vi nos outros: é um homem do futebol. Temo-nos dado bem com pessoas com essas características, basicamente antigos atletas. O José Mourinho é uma excepção, mas o pai foi treinador. Significa que se vai reforçar a aposta em jovens oriundos da formação? Não me meto nisso. Não quero que os treinadores possam dizer que foi o presidente que disse para jogar A, B, C ou D. Nunca o fiz e nunca farei. E Manuel Cajuda? Infelizmente a época estava a correr mal, mas todos somos culpados. Começou logo com o mau planeamento da época, em que facilitei. Entreguei o planeamento por falta de tempo, porque a minha vida é mais no estrangeiro do que em Portugal. Contrariamente ao que as pessoas pensam, não estou agarrado ao poder e fi-lo para começar a passar a responsabilidade. Dei-me mal, mas também podia ter acontecido comigo. O problema está no plantel? Houve uma mudança quase completa. É quase todo novo e isso faz mossa, apesar de serem grandes profissionais. Foi só isso? As arbitragens já nos tiraram à volta de 15 pontos. Uma coisa que aprendi é que não basta ter uma grande equipa. O homem de preto é que manda e os fiscais-de-linha ainda mandam mais do que o homem de preto. Há um lance capital, erram e já não há nada a fazer. Depois há outros problemas inerentes. Todos os dias há processos, há jornalistas que passam o dia à porta do tribunal à espera que entrem processos à União de Leiria. Tudo isto desestabiliza... É por sua causa que são poucas as pessoas a assistir aos jogos da União de Leiria? Custa às pessoas que José Mourinho tenha dito que os melhores presidentes que teve foi o Pinto da Costa e o João Bartolomeu. As pessoas de Leiria são invejosas. Eu não sou de Leiria, sabe? Sou do concelho de Porto de Mós, mas vim para aqui estudar com 10 anos. E como eu, milhares . Já me disseram para desistir, porque são sempre os mesmos a ir à bola. Leiria é uma cidade egoísta, as pessoas não são de cá e nunca se fidelizarão. Quais são os melhores negócios que fez? A União de Leiria tem feito bons negócios. Fomos felizes nas contratações e na altura os negócios tinham outros valores. O Derlei foi bom, o Helton e o Éder Gaúcho também... Também vendeu o Tahar para o Benfica... Sim, mas o Benfica paga sempre pouco, quem pagava bem era o FC Porto. Mas como não damos comissões, optam agora por ir buscá-los fora ou a custo zero. As relações com o FC Porto não estão boas... O futebol é mesmo assim. Zanguei-me com o FC Porto, agora estou zangado outra vez. Dou-me bem com o Benfica, mas também já nos zangámos. Todos os dias cometemos erros e eles também cometem. E com Raul Castro? Não é boa nem má, não falo com ele há meses e nem sequer o vejo. O Raul Castro foi presidente do Conselho Fiscal da União de Leiria durante oito anos, tratamo--nos por tu, mas desde que ele tomou posse só estive uma ou duas vezes com ele. Mas posso dizer que o presidente da Câmara deixou-se enganar pelo vereador Martinho. O que acha dele? Foi o pior vereador do Desporto que passou por Leiria e é difícil passar um pior. in jornal de Leiria 15-3-2012 Textos: Miguel Sampaio com João Nazário Fotos: Ricardo Graça |
quinta-feira, 15 de março de 2012
"Há uma estratégia organizada para acabar com a União de Leiria"
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Temporada 2011-2012
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Goste se ou não, o dia que este Sr.saír da União, o clube vem por aí a baixo.
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